Caixa de Ferramentas: Checklist para Avaliação Ergonômica Preliminar (AEP)
Entre as novidades da nova NR-17, aparece a demanda da Avaliação Ergonômica Preliminar (AEP). Todas as empresas, de qualquer porte ou risco, deverão fazê-la. Há lógica nesse encaminhamento, especialmente porque, com uma AEP bem-feita, já se pode propor soluções para uma série de situações em que há má condição ergonômica evidente, sem a necessidade de dedicar tempo a uma análise ergonômica completa que chegaria à mesma conclusão.
Outro ponto positivo é que se eliminou a prática de se cobrar análise ergonômica para tudo (muitas vezes banalizando-a e destinando-a a ser engavetada) e criou-se uma forma rápida de se ter uma visão das condições de não-conformidade ergonômica mais evidentes.
Desde que a Comissão Tripartite formou consenso da importância dessa ferramenta, a Ergo já começou a criar um checklist de AEP, que apresentamos ao público em novembro de 2020. Esse checklist está disponível para download gratuito ao final desta página. Nós também o incluímos no Guia Prático de Ergonomia, último lançamento da Ergo Editora.
No entanto, antes de apresentar a ferramenta sugerida por nós, é importante esclarecer a base teórica que dá origem ao checklist, para que o usuário compreenda como utilizar o método.
Desde o livro Índice TOR-TOM (2012), consideramos que existem 18 possíveis fatores de exigência ergonômica em qualquer trabalho: (Quadro 1).
Quadro 1: Os 18 Fatores que comprometem a condição de ergonomia de uma atividade (quanto mais fatores tiver a atividade, pior será considerada sua condição ergonômica)
1 – Postura básica de trabalho inadequada
2 –Força e esforço intensos
3 – Alta repetitividade sem os devidos tempos de recuperação
4 – Levantamento manual de pesos acima dos limites conhecidos
5 – Desvios posturais sabidamente críticos
6 – Contrações musculares estáticas sem a possibilidade de tempos de alívio
7 – Sobrecarga mental
8 – Alto dispêndio energético
9 – Calor
10 – Frio
11 – Vibração de corpo inteiro
12 – Vibração de ferramentas energizadas;
13 – Emanações: gases, poeiras e aerodispersoides
14 – Roupas constritivas
15 – Espaços restritos (não confundir com confinados)
16- Iluminação deficiente
17 – Ruído intenso
18 – Risco de acidente pela própria condição de execução do trabalho
A partir desses 18 fatores de exigência ergonômica no trabalho, podemos definir, para cada um deles, qual seria aquele limite definido como “inaceitável”, em poderíamos dizer que, definitivamente, trata-se de um trabalho de alta ou altíssima exigência ergonômica.
Por exemplo: no caso de um levantamento manual de pesos, um limite bem definido na literatura é o de 25 kg pela equação do NIOSH e Comunidade Europeia. Mesmo nas melhores condições, o levantamento de uma carga de 30 kg por qualquer trabalhador já se caracteriza como acima do limite da equação do NIOSH, portanto, uma situação de alta exigência.
Isso não quer dizer que um levantamento de 15 kg, por exemplo, também não seja de alta exigência ergonômica – mas essa conclusão ainda dependerá da análise de outros fatores: altura vertical e distância horizontal da carga, frequência de levantamento etc. Já o limite de 25 kg nos dá um resultado “rápido”, que nos permite classificar como de alta exigência qualquer levantamento de carga acima dele.
Dessa forma, ao invés de o profissional de ergonomia precisar realizar todas as medições necessárias para o cálculo do limite de peso recomendado pela equação do NIOSH e ainda incluir essa documentação no escopo de uma Análise Ergonômica do Trabalho completa, apenas para provar que se trata de uma condição inadequada, o critério de “desqualificação” já nos permite evidenciar uma má condição ergonômica e propor um plano de ação claro para a questão: nesse caso, diminuir o peso da carga.
Com base na definição de critérios de desqualificação para os fatores do Quadro 1, a Ergo elaborou 13 pontos de verificação destinados a atividades industriais e outros 5 pontos para postos de trabalho informatizados, formando assim o checklist para AEP.
Tendo essa base conceitual, é importante ao leitor atentar-se a outras observações importantes:
– Esses 18 fatores não influenciam na condição ergonômica na mesma proporção;
– Eles são considerados, em princípio, como exigências e não necessariamente como riscos; portanto, no exemplo dado, o levantamento de uma carga de 30 kg não necessariamente trará lesão ao trabalhador, pois não dispomos de todas as informações sobre a atividade, no entanto, já é caracterizada uma má condição ergonômica que deve ser corrigida;
– No entanto, se existirem na forma caracterizada no Checklist, fica explícito que aquela condição de trabalho “não passa” em nenhuma análise racional sobre condição de trabalho e tem que ser corrigida com prioridade;
– Porém, a inexistência dos fatores relacionados no Checklist não significa que a condição ergonômica esteja boa, mas quer dizer que o processo produtivo, em princípio, pode “rodar”, pois não há condições ergonômicas muito erradas.
Agora, com a compreensão sobre de onde vêm os critérios presentes em nosso checklist de AEP e como ele é utilizado, o leitor poderá aplicá-lo de forma rápida a todos os postos de trabalho da empresa. No entanto, não basta apenas aplicar o checklist de AEP – é preciso também dar o correto encaminhamento para essa avaliação, com a elaboração de planos de ação.
Como esse encaminhamento não é bem definido pela NR-17, muitas pessoas podem achar que, com a nova Norma, bastaria agora simplesmente fazer a AEP para todos os postos. Mas a AET (Análise Ergonômica do Trabalho) não deixou de existir! Então, e agora? Quando devemos utilizar a AEP e quando devemos fazer a AET? E o que fazer com esses resultados?
Foi para esclarecer essa questão que, junto ao checklist, também desenvolvemos um Fluxograma para encaminhamento dos resultados da AEP, que acompanha o material para download ao final desta página. Esse fluxograma deve sempre ser utilizado juntamente ao checklist.
A seguir, apresentaremos quatro exemplos de uso do checklist de Avaliação Ergonômica Preliminar em atividades simples e qual seria o encaminhamento adequado em cada um deles.
Exemplo 1 – Quando há uma não conformidade crítica bem evidente e a solução é relativamente simples
Veja a seguir a ilustração da atividade de embalagem de bobina metálica (Figura 1A):
Figura 1A – Embalagem de bobina metálica com pallet no nível do piso.
Fonte: Os princípios da ergonomia aplicada ao trabalho em 40 lições –
Lição 4 (Ergo Editora, 2022)
Essa atividade, por ser realizada no nível do piso, seria penalizada no checklist de AEP no item 2 (“Tronco encurvado para frente…”). Mesmo em situações de demanda de trabalho não constante, haveria a penalização, uma vez que, em cada ciclo de 4 minutos, o trabalhador permanece mais que 50% do tempo encurvado.
As consequências são desconforto, fadiga e aumento da pressão nos discos da coluna vertebral, que podem vir a caracterizar risco para a integridade dos discos intervertebrais. Assim, o analista anotaria a observação final: condição de trabalho não aprovada, com a justificativa escrita no item 2 do checklist.
Encaminhamento:
A solução da questão ergonômica encontrada demanda apenas uma melhoria de baixo investimento: a construção de suporte metálico de 55 cm de altura para que toda a embalagem da bobina seja feita com o tronco na vertical, conforme mostra a Figura 1B. Observe que, nesse caso, não foi e provavelmente não será necessária análise ergonômica, pois ficou bem evidente pela melhoria que a posição de trabalho agora está satisfatória.
Figura 1B – Embalagem de bobina metálica com pallet sobre plataforma de 55 cm.
Fonte: Os princípios da ergonomia aplicada ao trabalho em 40 lições –
Lição 4 (Ergo Editora, 2022)
Após a correção, seria feita a foto da nova condição de trabalho e seria atualizado o checklist, com a observação final: condição de trabalho aprovada.
Exemplo 2 – Quando há uma não conformidade crítica bem evidente e a solução é complexa
Figura 2 – atividade de levantamento de cargas
pesadas em altura desfavorável em um armazém
O profissional de ergonomia detectou, na área de logística, a necessidade de movimentar caixas bem pesadas, inclusive uma delas pesando 29 kg, colocando-a e retirando-a da posição longe do corpo. Essa situação é anotada no item 8 do checklist de AEP (“Levantamento de peso superior a 25 kg”). Ao final do checklist seria anotado: condição de trabalho não aprovada.
Encaminhamento:
A solução não é simples. Ela exige análise detalhada do peso das diversas caixas, verificação do número de itens que superam o peso máximo estabelecido, a frequência, a existência ou não da possibilidade de essas cargas serem arrastadas ao invés de levantadas e, para a solução, pode ser necessário ter que renegociar contratos com fornecedores. Nessa situação, a AEP terá detectado bem a questão, mas para uma solução consistente será necessário fazer uma AET – Análise Ergonômica do Trabalho.
Exemplo 3 – Posto de trabalho informatizado fora dos padrões de conformidade
Analise a Figura 3, que se trata de um posto de trabalho informatizado em um bloco cirúrgico hospitalar, em que a trabalhadora não possui espaço para as pernas, o monitor fica em altura elevada e há pouco espaço para o uso adequado de teclado e mouse.
Figura 3
Ela mostra bem um posto de trabalho improvisado, portanto detectado no item 1 do Checklist de AEP para postos de trabalho informatizados. O analista deverá ao final do checklist: condição de trabalho não aprovada.
Encaminhamento:
Como conduzir a situação? Pode ser que uma solução de baixo investimento possa resolver. Se esse for o caso, conclui-se o processo.
Mas também pode ser que a condição ergonomicamente inadequada esteja relacionada à falta absoluta de espaços e a layouts incorretos devido à limitação física de espaço em um bloco cirúrgico. Sendo assim, torna-se necessário fazer Análise Ergonômica do Trabalho. Nessa AET, além do profissional de ergonomia e dos trabalhadores envolvidos, pode ser necessária a participação de um arquiteto de interiores acostumado com demandas desse tipo.
Exemplo 4 – Quando a AEP não detecta exigências ergonômicas evidentes, mas ainda pode haver problemas
Figura 4 – Posto de trabalho de costura industrial
Costuras industriais estão presentes em confecções, em facções, em fabricantes de bancos de veículos e outras tantas empresas. Há diversas gradações de complexidade, podendo haver máquinas que exigem posturas em desvio e outras em que há necessidade de pinça pulpar fazendo força.
Nesse universo, há empresas com postos de trabalho bem estruturados, como o mostrado na foto, com bancada da máquina de costura de altura regulável por mecanismo elétrico e cadeira de boa qualidade ergonômica. Mas há também empresas com postos de trabalho primitivos, que não passariam no checklist, especialmente no item 4.
Encaminhamento:
A AEP feita da posição de trabalho mostrada na Figura 4 não evidenciou nenhum dos 13 itens do checklist e então a condição de trabalho foi classificada como condição aceitável. Na documentação, o profissional de ergonomia colocaria a foto e o checklist mostrando todas as 13 respostas como não. E colocaria a observação final: condição de trabalho aceitável.
Mas é fundamental lembrar que atividades repetitivas, como no caso de costuras, têm que ser acompanhadas pelos profissionais de ergonomia da empresa, especialmente para verificar quanto ao aparecimento de queixas entre os trabalhadores.
Na existência de queixas, apesar de a AEP não ter detectado qualquer ponto fora da conformidade, pode ser necessário investigar a carga de trabalho, a razoabilidade da produção cobrada, horas extras, ritmos forçados e mesmo esforço manual em pinça fazendo força. Assim, seguindo o fluxograma, na existência de queixas, para a investigação detalhada dos motivos, deveria ser feita uma análise ergonômica da atividade (AET), que resultaria em recomendações bem mais complexas do que simples melhorias.
Recomendações importantes ao analista:
Antes de começar a aplicar o Checklist de Avaliação Ergonômica Preliminar aqui sugerido, gaste algum tempo andando pela área de forma a entender o processo produtivo. Procure conhecer os principais produtos, incluindo aqueles que, pelo peso maior ou maior produtividade, podem resultar em esforços maiores ou processos mais acelerados. Identifique o modo de produção praticado quando ocorrem falhas em equipamentos. Também procure conhecer como são feitas as atividades periféricas.
Documente a condição de trabalho inadequada com fotografia, na qual apareça o trabalhador executando a atividade de alta exigência.
Oriente a empresa quanto às medidas de correção, classificando-as da seguinte forma: (a) situação passível de melhorias de baixo investimento ou pequenas melhorias; (b) solução conhecida, sendo necessário replicá-la naquele posto; (c) situação cuja melhoria necessita de estudo em maior profundidade. Para essas últimas, é indicada uma boa Análise Ergonômica do Trabalho.
Não deve o analista definir sozinho a solução, a não ser que tenha grande experiência com as questões encontradas. As melhores soluções são aquelas resultado de um consenso entre o analista, o gerente, o engenheiro ou técnico do processo e um trabalhador experiente.
Agora você já entendeu como utilizá-lo, já pode preencher o formulário abaixo para fazer o download do nosso Checklist de AEP (Avaliação Ergonômica Preliminar). Esperamos que faça um bom uso!
Para aprender mais, consulte nosso livro Guia Prático: os princípios da ergonomia aplicada ao trabalho em 40 lições.