CONTRIBUIÇÕES DA ERGONOMIA, HIGIENE, SEGURANÇA E MEDICINA DO TRABALHO PARA A QUALIDADE DE VIDA
Hudson de Araújo Couto
Qualidade de vida pode ser encarada sob 4 prismas diferentes: (a) condições mínimas de vida digna, (b) condições do meio urbano em que se vive, (c) qualidade de vida no trabalho e (d) aspectos pessoais. Visando dar uma abordagem mais holística e sistematizada a esse termo, a Organização Mundial de Saúde propôs, em 1995, que “qualidade de vida é a percepção do indivíduo de sua posição na vida, no contexto da cultura e sistema de valores nos quais ela vive e em relação aos seus objetivos, expectativas, padrões e preocupações”. Do ponto de vista subjetivo, qualidade de vida traduz o grau em que as pessoas se sentem competentes para atuar física, emocional e socialmente, julgando suas vidas dignas de serem vividas.
A OMS propõe então 24 facetas da qualidade de vida agrupadas em 6 domínios:
Área 1 – Domínio Físico
– Ausência de dor e desconforto
– Energia e ausência de fadiga
– Sono e repouso
Área 2 – Domínio Psicológico
– Sentimentos positivos
– Pensar, aprender, memória e concentração
– Auto-estima
– Imagem corporal e aparência
– Ausência de sentimentos negativos
Domínio 3 – Nível de Independência
– Mobilidade
– Atividades de vida cotidiana
– Independência de medicação e tratamentos
– Capacidade de trabalho
Domínio 4 – Relações Sociais
– Relações pessoais
– Suporte (apoio) social
– Atividade sexual
Domínio 5 – Meio Ambiente
– Segurança física e proteção
– Ambiente no lar
– Recursos financeiros
– Cuidados de saúde e sociais: disponibilidade e qualidade
– Oportunidade de adquirir novas informações
– Participação e oportunidade de recreação e lazer
– Ambiente físico: poluição, ruído, trânsito e clima
– Transporte
Domínio 6 – Aspectos espirituais, religião, crenças pessoais
– Espiritualidade/ religiosidade / crenças pessoais.
As áreas de Medicina, Segurança, Higiene e Meio Ambiente têm o potencial de atender a pelo menos a 15 dessas 24 facetas, a saber:
– Um bom sistema de assistência médica proporciona às pessoas cuidados de saúde, ausência de dor e desconforto, além de uma eficaz prevenção ao adoecimento.
– Uma eficiente área de higiene ocupacional irá lidar especialmente com a questão do micro-ambiente de trabalho, reduzindo na fonte os aerodispersóides e controlando os altos níveis de ruído dos processos produtivos.
– Uma eficiente área de controle do meio ambiente irá cuidar do ambiente externo à empresa, dentro de determinados limites, é claro;
– Uma eficiente área de segurança do trabalho irá garantir que, pelo menos durante o tempo disponível para a empresa, o indivíduo terá um nível adequado de segurança e não sofrerá acidentes (é bom lembrar que, de fato, nas empresas dotadas de trabalhos eficazes de segurança, o trabalhador costuma estar muito mais seguro dentro da mesma do que fora de seus muros).
Deve-se, ainda, dar o crédito à promoção de qualidade de vida nos demais aspectos não dependentes do trabalho, tarefa que comumente nos cabe, enquanto médicos do trabalho, fazer:
– Os programas de condicionamento físico, combate e prevenção ao tabagismo e controle da obesidade propiciam uma qualidade de vida melhor, especialmente após os 45 anos de idade;
– O controle dos fatores de risco de enfarte retardam as doenças coronarianas, contribuindo para diversos dos itens definidos pela OMS em qualidade de vida;
– E certamente o trabalho de prevenção do câncer e sua detecção precoce também estará contribuindo para uma vida de boa qualidade.
Mas é o trabalho de Ergonomia aquele que mais faz diferença em termos de qualidade de vida dos trabalhadores. A rigor, quando se encaram os desafios existentes na forma de realizar o trabalho, buscando e corrigindo as situações causadoras de afastamento, de dor, de desconforto, de dificuldade e de fadiga excessiva, melhoramos enormemente a qualidade de vida dos trabalhadores, pois:
– Elimina-se a dor ou desconforto na realização do trabalho;
– O trabalhador deixa seu trabalho sem fadiga excessiva, podendo ser cidadão nas horas que está fora da empresa;
– Trabalhando-se num sistema adequado de revezamento de turnos, seu sono será pouco prejudicado, bem como seu repouso será preservado;
– Sua imagem corporal e aparência, embora não dependam só desse fator, não sofrem o desgaste precoce, conseqüência comum dos trabalhos não ergonômicos;
– Garante-se uma boa mobilidade e um bom estado de saúde para as atividades de vida cotidianas;
– Previnem-se os tratamentos médicos e a dependência de medicamentos, próprios dos transtornos músculo-esqueléticos crônicos e dos distúrbios mentais;
– Preserva-se a capacidade de trabalho do cidadão, o que é um dos itens mais importantes na tendência atual de aposentadoria em idades mais avançadas;
– As soluções ergonômicas sabidamente melhoram as relações pessoais, sendo uma forma importante de solução de alguns tipos de conflitos, próprios das relações de trabalho;
– E numa abordagem mais atual, a Ergonomia se preocupa também com a questão da qualidade de vida no trabalho (aqueles fatores que, uma vez presentes na atividade laborativa, são os responsáveis pelo gostar do trabalho), repercutindo-se então em pelo menos 3 itens do domínio psicológico (sentimentos positivos, auto-estima e ausência de sentimentos negativos), bem como contribuindo para a saúde mental.
Os argumentos acima colocados certamente justificam a constatação freqüente de ser um trabalho sistemático de Ergonomia considerado pelos trabalhadores como de alto valor e um dos motivos de satisfação com a empresa.
Os itens de Ergonomia que estarão mais presentes na agenda das empresas nos próximos anos são os seguintes:
1- Dar respostas às questões ergonômicas relacionadas à reestruturação produtiva;
2- Prevenir eficazmente as doenças relacionadas às condições de ergonomia, levando a empresa a considerar esse item tão importante quanto a prevenção de danos ambientais; e tratar eficazmente o trabalhador acometido, retornando-o aos postos de trabalho melhorados, o mais rapidamente possível;
3- Lidar eficazmente com a demanda do Ministério Público do Trabalho;
4- Prevenção de indenização pelo dano;
5- O enfoque na organização do trabalho e na gestão;
6- O enfoque na qualidade de vida no trabalho;
7- O enfoque na saúde mental no trabalho;
8- Enfoque na empregabilidade: a questão do gênero, da idade e das pessoas portadoras de deficiência física;
9- O fator ergonômico na prevenção de acidentes.